domingo, 3 de agosto de 2014

Óscar Cardozo, o «jogador atípico» que virou melhor marcador estrangeiro de sempre no Benfica

Óscar Cardozo, o «jogador atípico» que virou 

melhor marcador estrangeiro de sempre no Benfica

Era um verão de mudanças, aquele de 2007. O terceiro lugar não tinha agradado, mesmo tendo ficado a dois pontos do campeão FC Porto e a um do Sporting. A pressão era enorme para Fernando Santos, que via Simão Sabrosa ser vendido ao Atlético de Madrid, Karagounis e Miccoli regressarem aos clubes que os tinham emprestado na época anterior. Voltava Manuel Fernandes, só que por pouco tempo - faria 'birra' para não jogar a pré-eliminatória da Liga dos Campeões com o Kobenhavn e rumaria ao Valencia. Mantinham-se Petit, Léo, Nuno Gomes ou Rui Costa (última época do maestro). Chegavam reforços: Butt para a baliza, Maxi Pereira, Zoro e Sepsi para a defesa, Bynia para o meio, os 'meninos' Di Maria e Freddy Adu, o uruguaio Cristián Rodríguez, Bergessio para a frente. Enfim, muitos nomes carregados de sonhos. Ah, e um tal de Óscar Cardozo, desconhecido mas com o pesado fardo de nove milhões de euros por 80% do passe que o Benfica pagou ao Newell´s Old Boys.

Chamavam-no Tacuara, nome que se dá a um tipo de plantas no Paraguai que crescem muito (podem atingir 12 metros) e em forma de cana. À primeira vista, fazia torcer o nariz, pois o seu pontapé com o pé esquerdo era fora do comum, quer em força, quer em colocação, só que o seu jeito desengonçado e lento não convencia.

Cardozo foi, no Terceiro Anel, aquele jogador que ora era amado, ora odiado. Marcando, era aplaudido, não marcando, vinha logo um coro de assobios e a divisão da nação encarnada. Porém, os números não merecem contestação, pois no Benfica nenhum estrangeiro marcou tantos quanto ele. Só oito portugueses fizeram mais tentos que o número 7, embora alguns deles com mais jogos do que o paraguaio, que totalizou 295 jogos e marcou 172 golos.

Contra o Fenerbahçe virou a eliminatória
Está iminente a tranferência de Cardozo para o Trabzonspor. Esteve para ir há um ano, quando o Fenerbahçe quis dar 12 milhões de euros, vai agora por cerca de metade. Foram sete épocas do número 7, várias conquistas, muitos golos e um lugar na história do clube, pelo menos na opinião de Rui Águas, antiga glória do Benfica com quem o zerozero.pt falou.

O filho de José Águas, por exemplo, ficou a 68 tentos da marca doTacuara. Se um está na história do clube e é lembrado para falar destas particularidades (como é o caso), o outro também estará, obrigatoriamente.

«Será recordado pelos números. Um goleador manter-se num clube tantos anos e com tanto rendimento dificilmente acontecerá nos moldes atuais do mercado, portanto será difícil tirarem-lhe esse recorde».


«Rendimento» e «eficácia» foram as palavras que vieram logo à cabeça de Rui Águas para definir Cardozo, um jogador que, saindo agora, o fará num momento em que já não apresenta a mesma performance que demonstrou outrora e que lhe valeu inúmeras aclamações: «Claro que as pessoas agora não reconhecem, pois ele não vem marcando ultimamente, ao contrário do que fez durante todo este tempo. Talvez se devesse um pouco a alguma saturação nos últimos tempos, necessidade de mudar, portanto talvez tenha sido a melhor solução».

O jogador, independentemente do que acontecer, perdurará na memória dos benfiquistas, não só pelos golos, mas pelo jeito peculiar como se apresenta em campo: «Fica marcado pela sua singularidade. É um jogador atípico, que teve que ultrapassar durante grande parte da sua permanência aqui alguma polémica em seu redor, nunca foi unânime, até porque é um tipo de jogador estranho. Quem olha para ele não augura nada de bom, fisicamente é esquisito, mas é daqueles que tem aquela diferença que faz um goleador: uma intuição muito grande, uma enorme capacidade de remate com o pé esquerdo, um jogo de cabeça razoável, mas que foi procurando melhorar, atingindo um nível bom». 

Crescimento com Jorge Jesus

Cardozo chegou em 2007 e assistiu logo a uma chicotada psicológica. Fernando Santos saiu na primeira jornada, depois de um empate com o Leixões, chegando Camacho, que também não terminaria a época - seria Chalana e, precisamente, Rui Águas. Foi o melhor marcador da equipa, como viria a ser nas épocas seguintes, embora não tenha sido totalmente feliz com Quique Flores, que preferia um ataque com Aimar e Suazo.

«Combateu com eficácia algumas debilidades que tinha, ainda que nem todos os treinadores apreciassem isso. O Quique, por exemplo, preferia o Suazo porque era mais rápido, mesmo nunca sendo um goleador. Hoje em dia, os treinadores têm a tentação de optar por isso», referiu Rui Águas ao nosso órgão.

Raio X [Treinador]
com
Jorge JesusÓscar Cardozo
222Jogos
152Vitórias
39Empates
31Derrotas
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Uma das imagens mais marcantes de Cardozo no Benfica 
Com Jorge Jesus, tudo mudou. Passou a ser a referência de ataque na equipa, servido por Di Maria, Aimar, Ramires e Saviola naquele Benfica campeão em 2009/2010, ano em que conseguiu pela primeira vez ser o melhor marcador do campeonato nacional, ano também em quemarcou mais golos no Benfica (38).

Os números continuaram a ser bem demonstrativos nas épocas seguintes e Cardozo termina com 133 golos marcados durante o reinado de Jorge Jesus, sendo que apenas Lima conseguiu rivalizar com a eficácia do paraguaio, em 2012/2013. A propósito, uma temporada que esteve para ser de sonho e que acabou num pesadelo marcante na carreira de Cardozo, que confrontou Jorge Jesus no Jamor, após a derrota com o Vitória SC.

Esse incidente despoletaria um derrame acentuado de tinta. Uns eram intolerantes com a atitude do paraguaio, outros minimizavam-na, como foi o caso de Eusébio (Cardozo 'retribuiria' no funeral do Pantera Negra, onde foi dos mais sentidos com a perda da figura do clube). Sair teria sido melhor?

«A época passada foi uma época diferente para ele, pois Rodrigo confirmou que é um valor de exceção. Ainda assim, ele não deixou de contribuir para os resultados do Benfica, mesmo numa medida um pouco mais abaixo. Somando a isso o facto de no ano passado terem havido valores diferentes, talvez tivesse sido melhor vendê-lo naquela altura, até porque a idade dele conta, mas não foi assim. O Benfica apostou em manter um valor seguro, habituado ao clube e a fazer golos, portanto é de aceitar essa decisão», avaliou Rui Águas.

Fez 12 golos em 16 jogos a Patrício, a vítima preferida do paraguaio 
Jogo de homenagem?

Recentemente, Deco teve direito a uma homenagem conjunta entre FC Porto e Barcelona. Na conversa que manteve com Rui Águas, o zerozero.pt perguntou se tal não seria justo acontecer também com o paraguaio. O entrevistado disse saudar «sempre esses jogos de homenagem», embora reconheça que já não se lembra do último, pois «antigamente existiam mais regularmente do que agora».

Em todo o caso, Tacuara seria candidato a tal: «Cardozo foi um jogador marcante, não há muitos que tenham tido a influência no clube como ele teve».

Agrediu um espanhol aos 9 minutos de uma eliminatória com o Getafe (1x2), foi suplente com Quique, empurrou Jorge Jesus, falhou um dos penáltis da final contra o Sevilla. Marcou 13 golos ao Sportingsete ao FC Porto, fez os golos do título em 2010 contra o Rio Ave (2x1), virou uma eliminatória com o Fenerbahçe (3x1) que deu final europeia mais de 20 anos depois, marcou três em 33 minutos no eletrizante 4x3 da Taça de Portugal com o rival leonino.

Pode já não ter mais para escrever com a camisola do Benfica, mas da entrada na galeria dos imortais do clube já não se livra. Amado ou odiado.

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