quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Luís Freitas Lobo - Egos no Balneário




Problema são os egos no balneário e um treinador que aceitou viver no meio deles. 


O poder de um treinador pode ter diferentes origens mas só pode ter um (duplo) suporte: a sua personalidade e um clube que o respeite. Por isso se fala tanto de como simples treinadores ganham num lado e outros, ditos grandes treinadores, perdem noutro.

A personalidade desse treinador nunca deve oscilar em função das circunstâncias. Entre a imagem de Jesus no banco nas suas primeiras épocas no Benfica, aguerrido e motivado, e a atual, introspetivo e parado, existe um abismo emocional. Um abismo que espelha a sua transformação interior fruto do exterior que o rodeia. Ficar num balneário feito um campo de minas com Cardozo no meio é diferente do balneário original onde entrou para impor autoridade, uma palavra que hoje se perde por entre um entorno (atmosfera que o rodeia) que se antes o respeitava e temia, agora ataca-o e desconfia dele.

Jesus aceitou ficar nestas condições e agora paga um preço alto por isso. O futebol do Benfica e seu pretenso (muitas vezes real) mau momento pode, assim, ser analisado em dois prismas: o meramente tático (futebol puro) e o político-emocional (mais complexo). Nesta visão bífida da realidade, o pior que pode acontecer a um clube é perceber que os problemas extra-relvado são mais difíceis de resolver do que aqueles que sucedem dentro do campo taticamente.

No plano tático, o maior equilibrio defensivo que Fejsa podia dar jogando a pivô esbarrou no bloqueio de movimentação que Matic sentiu e revelou ao passar a posicionar-se mais à frente. Estranho para um jogador que, no fundo, estava a regressar às suas origens. 

Jesus corrigiu essa sua opção mas a equipa choca agora com outro problema para soltar o futebol ofensivo que sempre gostou: faltam extremos. A lesão de Salvio foi um tiro no coração da dinâmica atacante do onze. Ola John é uma aposta cada vez mais ténue, parece que regrediu esta época e Markovic não é, claramente, um avançado de faixa. 

Neste contexto, o melhor jogador, capaz, ao mesmo tempo, de estabilizar o jogo posicional da equipa em posse nos últimos 30 metros como, logo depois, surgir a desequilibrar pela faixa, é Gaitán.

O mais perturbante, porém, é sentir que, ao falar-se (ou, neste caso, escrever) sobre a equipa e suas questões táticas, se está, no fundo, a distanciar a análise do verdadeiro problema que afeta (e condiciona) hoje a equipa. Os egos do balneário a baterem com a cabeça no teto e um treinador que depois de empurrado pelo goleador aceitou viver encurralado no meio deles.

Uma liderança fragilizada é coisa que não existe. Ou se é líder (se se tem condições para o ser) ou não. Se as condições para Jesus continuarem a esgotar-se, a responsabilidade será tanto dele como de quem tinha a obrigação de quando apostou tanto nele ter-lhe criado essas condições externas em face da fragilidade em que ele estava. 

Um presente futebolisticamente envenenado envolto em milhões de euros. É possível? 

- Luís Freitas Lobo, jornal A Bola, 9 de Outubro de 2013

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