sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

A volta à Luz em 15 Manéis

A volta à Luz em 15 Manéis

A propósito de Matic, o saldo das mexidas mais influentes no onze do Benfica durante a era Jorge Jesus.

«Se não jogar o Matic joga o Manel, não vai haver problema»

A frase de Jorge Jesus, dita na flash interview da TVI, após a vitória sobre o Leixões para a Taça da Liga, tornou-se viral em poucas horas. Mas, no fundo, não fez mais do que dar um novo nome a um processo antigo. Como o técnico do Benfica faz questão de lembrar sempre que tem pretexto, a substituição de peças no onze base por força da saída de habituais titulares tem sido um dos aspetos mais visíveis no seu trabalho.

De 2009 a 2014, de Di María a Matic, houve pelo menos sete «maneis» que o técnico do Benfica teve de encontrar após propostas mais ou menos irrecusáveis do exterior: as que vieram do Real Madrid (Di María e Coentrão), Chelsea (Ramires, David Luiz e Matic), Manchester City (Javi Garcia) ou Zenit (Witsel)

A este número, convém juntar todas as mexidas que resultam das saídas ditadas pela perda de confiança do treinador em alguns jogadores (casos de Quim, Roberto, Emerson e Melgarejo). Mesmo deixando fora desta lista jogadores que foram perdendo espaço no onze por opção técnica mas continuaram no plantel sem estatuto de titulares (Aimar, Saviola, Bruno César, Nolito, entre outros) o substituto de Matic será o 15º «manel» que Jorge Jesus vai tirar da cartola desde o verão de 2009. Eis o balanço, as soluções encontradas, e as repercussões na equipa.
2009/10: sempre a melhorar
No verão de 2009, Jorge Jesus chega ao Benfica com vários trunfos na manga. Assim, tem carta branca para proceder a mudanças no onze base usado por Quique Flores (Quim; Maxi Pereira, Sidnei, Luisão e David Luiz; Rúben Amorim, Yebda, Katsouranis, Reyes, Aimar e Cardozo). Algumas das mudanças resultam das suas ideias. As mais visíveis são a aposta no regresso de Fábio Coentrão para lateral esquerdo, a fixação de David Luiz no eixo e o recuo definitivo de Aimar para terrenos mais recuados. Mas três das alterações implicaram entradas e saídas no plantel.
Nome: YebdaCausa da mudança: opção do treinador
Solução: empréstimos sucessivos (Portsmouth e Nápoles), substituído por troca direta
«Manel» encontrado: Ramires
Diagnóstico: melhoria clara.
Nome: KatsouranisCausa da mudança: opção técnica/ vontade do jogador
Solução: transferido para o Panathinaikos, substituído por troca direta
«Manel» encontrado: Javi Garcia
Diagnóstico: melhoria.
Nome: ReyesCausa da mudança: fim do empréstimo do At. Madrid
Solução: troca direta com Di María, suplente com Quique.
«Manel» encontrado: mexida tática com Saviola a titular, Aimar mais recuado e Rúben Amorim sacrificado no meio-campo.
Diagnóstico: melhoria clara
Onze mais utilizado nessa época (4-1-3-2): Quim; Maxi Pereira, Luisão, David Luiz e Fábio Coentrão; Javi Garcia, Ramires, Aimar, Di María; Cardozo e Saviola
2010/11: o preço do sucesso
Depois de uma primeira temporada triunfante, Jorge Jesus deparou-se no verão de 2010 com dois problemas incontornáveis: as saídas de Ramires e Di María, aliciados por clubes com outro estatuto. As soluções vieram do mercado: Salvio veio por empréstimo, Gaitán a título definitivo. Mesmo que os adeptos da Luz continuassem a sentir saudades dos dois jogadores negociados, não foi por aí que a temporada se estragou. Já o terceiro problema, criado exclusivamente por opção de Jesus, teve efeitos duradouros numa temporada dececionante. A dispensa abrupta de Quim e o «flop» da contratação de Roberto marcam uma das decisões com efeitos mais negativas da era JJ no Benfica.
Eliminado na Champions, e com o título praticamente perdido na primeira volta, o Benfica não teve como resistir à venda de mais uma referência no mercado de inverno. A saída de David Luiz para o Chelsea foi solucionada a dois tempos: primeiro, com a recuperação de Sidnei e a chegada de Jardel, até final da época. Depois, no verão, com a contratação de um «manel» de qualidade.
Nome: QuimCausa da mudança: opção do treinador
Solução: dispensa imediata
«Manel» encontrado: Roberto Jiménez
Diagnóstico: desastre total.
Nome: RamiresCausa da mudança: oferta do Chelsea (22 milhões)
Solução: ajuste no meio-campo, aposta num extremo mais clássico
«Manel» encontrado: Salvio, emprestado pelo At. Madrid
Diagnóstico: saldo equilibrado.
Nome: Di MaríaCausa da mudança: oferta do Real Madrid (25 milhões)
Solução: troca direta por outro extremo
«Manel» encontrado: Gaitán
Diagnóstico: perda controlada.
Nome: David LuizCausa da mudança: oferta do Chelsea (25 milhões mais o passe de Matic)
Solução: regresso de Sidnei à titularidade, chegada de Jardel
«Manel» encontrado: Garay, na época seguinte
Diagnóstico: perda controlada.
Onze mais utilizado nessa época (4-1-3-2): Roberto; Maxi Pereira, Luisão, David Luiz (Sidnei)* e Fábio Coentrão; Javi García, Salvio, Aimar, Gaitán; Cardozo e Saviola.
2011/12: muda o desenho, prossegue a frustração
Ao «annus horribilis» de 2011, em que o FC Porto faz o pleno dos troféus e o Benfica perde em toda a linha com o rival, segue-se um verão dedicado a reestruturar a equipa. Há mais duas saídas inevitáveis que não são bem resolvidas (Fábio Coentrão e Salvio, cuja cláusula com o At. Madrid era incomportável) e um ajuste obrigatório na baliza, que corre bem. 
Escaldado por uma estreia desastrosa na Champions, e sem alternativas sólidas à perda de confiança em Saviola, Jesus muda o figurino da equipa (de 4-1-3-2 para 4-2-3-1), ajustando-o às necessidades da Europa e, não por acaso, consegue o melhor desempenho encarnado em anos recentes, levando a equipa aos quartos de final. Em termos domésticos é que é pior: desperdiça na segunda volta uma vantagem de cinco pontos e perde o título para o FC Porto.
Nome: RobertoCauda da mudança: perda de confiança do treinador e dos adeptos
Solução: cedência/transferência para o Zaragoza; aposta num novo guarda-redes, em fim de contrato e adaptado a Portugal.
«Manel» encontrado: Artur Moraes
Diagnóstico: melhoria clara no primeiro ano, ténue depois.
Nome: Fábio Coentrão

Causa da mudança: proposta do Real Madrid (30 milhões)
Solução: contratação de um lateral-esquerdo de raiz, proveniente do campeão francês
«Manel» encontrado: Emerson
Diagnóstico: perda irreparável, até à data
Nome: SalvioCausa da mudança: fim do empréstimo do At. Madrid
Solução: mudança tática, com o fim dos extremos puros, passagem para um avançado e reforço do meio-campo, com a inclusão de Witsel.
«Manel» encontrado: Nolito e Bruno César, à vez.
Diagnóstico: perda significativa.
Onze mais utilizado nessa época (4-2-3-1): Artur Moraes; Maxi Pereira, Luisão, Garay e Emerson; Javi Garcia e Witsel, Nolito, Bruno César e Gaitán; Cardozo.
2012/13: obra-prima falhada
A época de todas as frustrações benfiquistas começa por ser, até maio, aquela que dá mais razões para alimentar o ego a Jorge Jesus, mesmo sem resolver a questão do lateral-esquerdo. Primeiro na forma como consegue controlar, sem grandes danos internos (na Champions, a conversa volta a ser outra) a estúpida sanção disciplinar a Luisão num jogo de pré-temporada. Depois, no regresso ao desenho tático inicial, com a contratação de Lima a recontruir uma parceria de sucesso com Cardozo. Finalmente, na forma inteligente como, com a época já em andamento, o técnico consegue substituir duas peças essenciais como Witsel e Javi Garcia, atraídos por mais duas propostas de alto calibre, de Zenit e Mancheser City. 
Mas com a obra-prima quase concluída, tudo ruiu num sprint final de pesadelo, com três quedas sucessivas. Especialmente no jogo do Dragão, com o FC Porto, a equipa acabou por pagar o preço da falta de alternativas a um onze base de grande qualidade. Mas uma coisa é certa: em 2013, não foi pelos «manéis» de JJ que o Benfica acabou com zero títulos.
Nome: EmersonCauda da mudança: perda de confiança do treinador e dos adeptos
Solução: transferência para o Trabzonspor
«Manel» encontrado: adaptação de Melgarejo, um novo projeto de Fábio Coentrão
Diagnóstico: saldo equilibrado.
Nome: Javi GarciaCausa da mudança: proposta do Manchester City (20 milhões)
Solução: aposta num jogador do plantel e que estava a ser preparado para o efeito
«Manel» encontrado: Matic promovido a titular
Diagnóstico: melhoria
Nome: WitselCausa da mudança: proposta do Zenit (40 milhões)
Solução: aposta no regresso de um jogador do plantel, adaptado a uma nova posição
«Manel» encontrado: Enzo Pérez a médio centro.
Diagnóstico: melhoria.
Onze mais utilizado nessa época (4-1-3-2): Artur Moraes; Maxi Pereira, Luisão, Garay e Melgarejo; Salvio, Matic, Enzo Pérez e Gaitán, Cardozo e Lima.
2013/14: impacto adiado
Numa temporada em que a conquista do título se torna obrigatória, o Benfica surpreende no verão ao manter todos os jogadores essenciais. A única mudança forçada parte do próprio treinador, que abandona o projeto Melgarejo, aceitando a sua saída para a Rússia. A alternativa Cortez é um fiasco, que Sílvio e Siqueira atenuam depois. 
Os maus resultados no início, o caso disciplinar de Cardozo e a lesão de Salvio provocam alguma instabilidade nas ideias de Jorge Jesus, que varia entre o 4x4x2 e o 4x3x3, enquanto vai testando reforços sucessivos, que nem sempre respondem à altura. A estabilidade parece chegar no fim do ano, mas tarde de mais para salvar a Champions. A venda de pelo menos um jogador de peso torna-se inevitável, as palavras do próprio Luís Filipe Vieira preparam a saída de Matic. Com meia temporada para defender a liderança, Jorge Jesus vai ter de encontrar o 15º «manel» da sua passagem pela Luz. Nada garante que seja o último.
Balanço
Das 14 alterações no onze base motivadas por saídas do plantel, só três - Di María na vaga de Reyes, em 2009, Matic na de Javi e Enzo na de Witsel foram internas, com recurso a jogadores que já estavam no plantel. Até à data, nenhum «manel» de Jesus foi português.
Perdas: Quim/Roberto, Di María/Gaitán, David Luiz/Sidnei, Coentrão/Emerson, Salvio/Nolito
Neutro: Ramires/Salvio, Emerson/Melgarejo, Melgarejo/Siqueira
Ganhos: Yebda/Ramires, Katsouranis/Javi Garcia, Reyes/Di María, Roberto/Artur, Witsel/Enzo Pérez, Javi/Matic.

Sem comentários:

Enviar um comentário