sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

«Contra o FC Porto, o Benfica nunca foi o Benfica que jogava com as outras equipas»

Vitor Pereira diz que contra o FC Porto, o Benfica nunca foi o Benfica que jogava contra as outras equipas»

Vítor Pereira é o homem das manchetes desta sexta-feira. O ex-treinador do FC Porto faz capa no jornal O Jogo e pontua ainda n' A Bola e no Record com declarações sobre o clássico deste fim-de-semana. No resumo das entrevistas, salta à vista uma convicção: a de que é a dinâmica do FC Porto que tem feito a diferença nos duelos com o Benfica.

O jornal O Jogo aproveitou a conversa com o atual técnico do Al-Ahli Jeddah para aprofundar questões táticas relacionadas com os últimos clássicos, procurando junto do homem do leme as justificações para as estatísticas: em quatro partidas para o campeonato, Vítor Pereira nunca perdeu com o maior rival dos azuis e brancos.

«Quando defrontávamos o Benfica, o que procurávamos era agarrarmo-nos às nossas ideias de jogo»
©Catarina Morais
«O Benfica é uma equipa que acelera constantemente a bola. Contra uma equipa que não tenha a capacidade que o FC Porto tem para ter bola, o jogo cai numa dinâmica de transições constantes e aí o Benfica leva vantagem, porque é o futebol a que está habituado. Mas como o FC Porto retirava a bola ao Benfica e a possibilidade de ter tantos momentos de transição, é claro que quem tem a bola domina o jogo. Nós tínhamos essa capacidade, retirávamos a iniciativa do Benfica, pela dinâmica, não pelo sistema. Contra o FC Porto, o Benfica nunca foi o Benfica que jogava com as outras equipas, mas graças aos princípios em que acreditávamos e que estimulávamos no treino», começou por revelar o treinador de 45 anos.

«O meu 4x3x3 era de posse e pressão. Quando defrontávamos o Benfica, o que procurávamos era agarrarmo-nos às nossas ideias de jogo, não adulterar fosse o que fosse, acreditar nos nossos processos e impor o nosso futebol. Jogando em casa ou na Luz, conseguimos sempre ser dominadores, ter mais posse e somar melhores resultados. E isso só foi possível porque acreditámos no nosso jogo», comentou.


O antigo timoneiro dos dragões salientou ainda que foi no ano de André Villas-Boas que começou a ver «alterações no Benfica» de Jorge Jesus na abordagem aos encontros com o FC Porto. E que foi precisamente no «célebre jogo» dos
 5x0, «em que o David Luiz apareceu como lateral-esquerdo», que as águias... 'perderam o norte'. «Esta é a minha opinião, mas um sinal destes, a uma equipa, é um sinal de receio. E mais: dá confiança à outra equipa», apontou.«Nós estudávamos uma forma de condicionar o Benfica para o lado de construção que pretendíamos, se queríamos que eles saíssem mais à direita ou à esquerda, para os atacarmos e roubarmos a bola. Sabíamos que nos convinha que a bola entrasse em determinados jogadores. Às vezes não é possível, mas a ideia era puxar o Benfica para o lado que mais nos convinha. Quando a bola ia ao guarda-redes, não os deixávamos sair, e eles são uma equipa que não está habituada a ser pressionada», vincou Vítor Pereira.

«Num jogo grande, o jogador tem de sentir os seus referenciais»

«Alterar a identidade é sinal de insegurança», disse ainda.
«Num jogo grande, o jogador tem de sentir os seus referenciais, aquilo que ele reconhece, aquilo que trabalha há meses. Se nós, treinadores, chegamos a um jogo desta importância e ainda sobrecarregamos a tensão com uma nuance tática, retiramos confiança. Agora, se estiver trabalhado, OK. Mas não sou de mudanças, muito menos se der a entender que estou com medo», afirmou Vítor Pereira, deixando também a nota de que «esse Benfica, quando defrontava o FC Porto, tinha receio de ser humilhado».
Em relação a Jorge Jesus, com o qual teve várias trocas de palavras por força dos cargos ocupados, Vítor Pereira não se quis agora alongar em comentários. Mas não escondeu a sua posição quanto ao estilo de jogo predileto do técnico encarnado.
«Definir se um treinador é melhor do que o outro é uma estupidez. Há adeptos que gostam muito da ideia de jogo do Jesus. OK. Eu respeito, mas tenho a minha e há quem goste. Eu quando vejo um jogo em que a bola está constantemente entre uma área e outra, para mim isso é sinal de desorganização das equipas, é sinal de descontrolo e imaturidade táticas. Não gosto desse jogo. Mas querer determinar que alguém é melhor do que alguém não faz sentido e eu nunca me senti em disputa direta com o Jorge Jesus», encerrou o espinhense.
«Felicidade», por Vítor Pereira
O último clássico entre as duas equipas está ainda bem marcado na mente de adeptos, jogadores e treinadores. O golo de Kelvin aos 92 minutos alterou por completo o rumo do campeonato e tornou o jovem brasileiro um herói no Dragão, ao mesmo tempo que ajoelhou Jesus.
Vítor Pereira, que lançou o número 28 do FC Porto aos 79 minutos da partida, confessa que ao recordar-se dessa noite só a pode definir com uma palavra: «Felicidade». Sentimentos à parte, foi com uma análise cuidada que avaliou a importância das substituições nesse duelo.
«Há dois lados [no momento de efetuar uma substituição]: o lado racional e o lado intuitivo. Quando o racional já não dá o que pretendemos, vamos ao lado intuitivo, lançando um jogador que sabemos que não é taticamente maduro, mas que do ponto de vista individual nos pode trazer coisas diferentes. Por isso considero que um plantel deve ter, para a mesma posição, dois jogadores com qualidades distintas, que nos permitam gerir o jogo com a diversidade das suas características e até da sua experiência ou juventude», salientou.

«Para mexer num clássico, é preciso ter convicções. O lado intuitivo é importante, mas há que ter muita coragem», prosseguiu Vítor Pereira, que indiretamente até agradeceu a aposta de JJ em Roderick, em detrimento de Gaitán, decorriam 66 minutos de jogo...
«Se o treinador dá um sinal de receio, a equipa encolhe-se. É natural que isso aconteça. Se temos dois avançados e retiramos um para colocar alguém a meio-campo, damos uma mensagem, que até pode estar, racionalmente, correta. Mas com aquela tensão, do ponto de vista emocional, se vejo a minha equipa tirar jogadores de características ofensivas e lanço outros de características defensivas, é porque é a hora de recolher, de defender o resultado», exemplificou.

«O Kelvin lembrou-se de algo que ninguém esperava... e decidiu»
«Do outro lado, foi hora de arriscar, de ir atrás do resultado porque não havia outra forma. Eu vi os meus centrais a perder posição, vi desequilíbrios que nos podiam ter custado o segundo golo do Benfica, mas o que é que nos adiantava o empate? Eu tinha era de dizer à equipa que era para ir para a frente. O golo do Kelvin decide um campeonato, é um momento de felicidade. Quando o lancei, disse-lhe: 'Kelvin, tu és irreverente, atrevido, se tiveres oportunidade vai para cima deles, vai por lá fora e resolve'. Podia não ter dado absolutamente nada, mas ele teve confiança, foi mesmo para cima e foi feliz. O Kelvin foi para jogo sem maturidade para uma decisão daquelas, mas a questão é que a irresponsabilidade do Kelvin fez a diferença. Um jogador taticamente mais maduro tinha cruzado. O Kelvin lembrou-se de algo que ninguém esperava, nem o próprio Artur... e decidiu», concluiu Vítor Pereira a O Jogo.
Por fim, através do diário A Bola, o treinador do Al-Ahli mandou ainda uma mensagem de confiança a Paulo Fonseca. «O que não nos mata torna-nos mais fortes e preparados», atirou. «Só passando pelas experiências é que crescemos e aprendemos. O Paulo sabe que no FC Porto um empate é um desastre. É uma questão de mentalidade, mas ele tem imenso valor e vai continuar a provar isso, agindo sempre com conformidade», apostou Vítor Pereira.

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